boogie woogie

SALA DE EXPOSIÇÕES TEMPORÁRIAS




O Boogie Woogie é parte integrante da Janela Indiscreta e não pode ser vendido em separado
sexta-feira, março 28
 

Sobre essa necessidade de ver fotografias e outros achaques


Passo metade do ano a ver e a pensar e a outra metade a ver e a fotografar. Quando penso muito, pode acontecer-me escrever, mas não consigo fotografar. Quando começo a fotografar, deixo de compreender o pensamento e as palavras. Também não sou muito apaixonada por teorias. E adoro ir aos alfarrabistas buscar fotografias antigas. Nem sei de quem são, mas adoro-as na mesma: escolhê-las, sobretudo. Tenho muitas fotografias antigas, algumas de avós, de bisavós e de tias bisavós que nem sei que nome tinham mas que posaram a usar objectos familiares. E vejo sempre todas as fotografias que as pessoas me mostram. Às vezes dizem ‘ah, não são nada de especial’, quase a desculparem-se e como se as minhas fossem grande coisa, eu vejo-as na mesma e gosto muito. Ver fotografias é um vício e uma alegria. Depois gosta-se mais ou menos das fotografias em si, mas ver fotografias, aquilo que se passa antes de qualquer opinião ter a ousadia de aparecer, é excelente, é excelente!
O que sinto que me faz compreender mal o pensamento quando fotografo mais é que passo a ver mais também. Noto bem isto, como fotografo por estações: é impossível fotografar sem gostar de ver mas não é menos verdade que fotografar agudiza o olhar. Fotografo porque vejo mas, quanto mais fotografo, mais vejo. Sobretudo ao nível de pormenores. Se passar duas semanas inteiras a fotografar, ao fim desse tempo distingo mais duas dezenas de tonalidades de azul que antes. Se parar, as tonalidades começam a ser invisíveis e as superfícies menos matizadas e mais lisas e pobres. E isto passa-se com todas as outras cores, com as texturas, com a dureza das sombras, com a percepção de escalas, de contrastes e com a coloração da luz nas diversas horas do dia. Não notas isto, Lídia? :)
Quando vejo muito e mais, não sei, acho que fico a pensar ‘questionar o mundo para quê se há tantas coisas para ver?’ Acho que fico repleta, como Drummond de Andrade naquele poema sobre a ‘manhã sem carência de mito e mel sorvido sem blasfémia’. Ele calava-se. Eu esqueço as perguntas, esqueço muitas coisas ou quase tudo. Entro numa espécie de semi-autismo. Não me interessa comunicar por palavras ou sequer comunicar. Seria incapaz de explicar isto numa altura dessas. Só consigo ver coisas, fotografá-las e depois ver as fotografias. E ver mais.
Quando fotografo muito parece-me que, sob determinada luz, tudo tem dignidade fotográfica. Ou então que as coisas só existem para a luz incidir sobre elas. O mundo inteiro passa a girar à volta do fenómeno luz e eu vou atrás. É doença, eu sei. Deve ser. Só pode ser.



 

fotografia no cinema



(3)


é mais do que um monumento de fotografia, é uma obra de arte.
é, sem dúvida, uma grande lição de fotografia.
é um poema em imagens, em fotografias.
é um poema a preto e branco com tanta luz.
já perdi as vezes que vi Persona.
quando o volto a ver, é sempre o primeiro olhar que volta,porque não há maneira de sublinhar uma cena, não há maneira de influenciar uma segunda visão-leitura.
não, a fotografia não é um elemento secundário, porque, vamos a ver, o cinema é ainda uma questão de fotografia.
agora que comecei a dizer alguma coisa sobre fotografia, obviamente penso mais em fotografia e, também assalta-me a vontade de deixar de escrever.hoje pensei em passar pela fnac, pelo fim da tarde, pra ver fotografias, fotografias. ver somente e não pensar nas referências imediatas à outros fotógrafos. é cada vez mais complicado ver fotografia sem cair na sedução dos cruzamentos.







quinta-feira, março 27
 

Vermeer não é só a luz "barroca". Ana, vê a perspectiva aqui...








A minúcia de Vermeer em mínimas palavras:

Vermeer de Delft

É manhã no copo:
Tempo de decifrar o mapa
Com seus amarelos e azuis,
De abrir as cortinas – o sol frio nasce
Nos ladrilhos silenciosos –,
De ler uma carta perturbadora
Que veio pela galera da China:
Até que a lição do cravo
Através de seus cristais
Restitui a inocência.


Murilo Mendes





 

Fiat lux, mandou Deus. E fez-se a luz; e, com ela, as cores e as suas infinitas tonalidades. Vermeer explicou-nos o milagre.



a woman asleep 1657



girl reading a letter at an open window 1657



officer and laughing girl 1658-60



the milkmaid 1658-60



girl with wine glass 1659-60



view of delft 1660-61



young woman with a water pitcher 1664-65



the lacemaker 1669-70



lady writing a letter with her maid 1670




terça-feira, março 25
 

Boogie Woogie não é só fotografia! Também é pintura!




Kathe Kollwitz ,The Prisoners (1908)


Kathe Kollwitz ,The Mothers (1921)




 
Sebastião Salgado









 

Sobre fotografar sons, Ana.



A música distancia muito da fotografia, pois a música não é visível. no entanto, há muitas músicas que evocam imagens, fotografias. é curioso o facto do cinema, que é imagem em movimento, querer a companhia da música. há as bandas sonoras. há os video-clips. há as orquestras nos filmes. a música está longe da imagem, porém querem colocar a música por perto, quase sempre.
pois, há possiblidade de impor som à fotografia, sugerindo mesmo o som ou tirando proveito da nossa imaginação. Contudo, mais do que o som, a música que se pode impor, gosto do silêncio que fecha certas fotografias, naturalmente.
lembro-me do cinema mudo, em que o rosto mudo, o milagre do rosto mudo (por vezes)transcendiam qualquer música que colocassem por cima.



Arnold Newman
Igor Stravinsky, 1946



Arnold Newman
Stravinsky's Hand


Arnold Newman
Violin Patterns







 

Ainda Van Gogh:
Start the experience.




 

No Blogsempt estamos listados como um blog de fotografia... ooooopst... e eu com tanta vontade de deixar aqui mais uma tela do Mar do Norte, outra vez Scheveningen, mas, desta vez, de Van Gogh :)


View of the Sea at Scheveningen, 1882
Oil on Canvas, 34.5 X 51 cm
Van Gogh Museum, Amsterdam


Não é lindo? Gosto deste mar :)



segunda-feira, março 24
 

A fotografia no cinema
(2)


É fantástico que fales justamente no Persona, de Bergman, um monumento da fotografia em cinema. Lembro-me de fazer um esforço enorme para não pestanejar a primeira vez que o vi, com medo de desperdiçar alguma tonalidade ou algum movimento. Aprende-se fotografia a ver esse filme que sozinho bastaria para calar quem diz que no cinema a fotografia é secundária ou não tem tanta importância assim. Acho que nunca vi imagens tão belas em cinema!

Se olhar através da máquina meia-hora sem interrupção, ainda que só tire 2 ou 3 fotografias nessa meia-hora, as coisas sucedem-se através da lente. Há uma viagem de imagens muito semelhante à do cinema. Há uma ligeira distorção das imagens no limite do campo de visão da máquina, à medida que nos movemos, que me agrada muito :) Há cerca (há, há, há!) de um mês vi a versão restaurada do Lola Montès de Max Ophüls. Além das coisas incríveis feitas com as cores (ele foi ao ponto de pintar partes de cenários para saturar cenas), à primeira cena percebi que a perspectiva era toda móvel, toda sensível, o que me predispôs quase imediatamente a gostar do filme.
A mim d’As Horas/história ficou-me o enterro do pássaro. A facilidade de acesso a um mundo suposta e exclusivamente infantil, no qual Virginia permanecia mais tempo do que as crianças.




 

A fotografia no cinema

( 1)

Não consigo fugir ao teu mote sobre a fotografia no cinema, sem dizer nada.
Vou apanhar esta tua frase "Vou ao cinema em busca de mais viagens através de imagens e de perspectivas".
Ao contrário da fotografia que fixa uma imagem, o cinema é, na sua essência, a imagem em movimento. Daí também as viagens. (Com a fotografia consegues fazer as mesmas viagens?)
No entanto, há momentos em que o realizador, num longo plano, fixa a câmara num rosto, num objecto,etcs. E, assim, surge a fotografia de dentro do cinema. Eu podia desenrolar uma série grande de fotografias que o cinema me deu. O rosto de Alma e o rosto de Elisabet em Persona de Bergman; os olhares de fé, de esperança no quarto de Inger Borgen, acabada de morrer...e o milagre da palavra, a alma de volta ao corpo...em Ordet de Dreyer ;o rapaz que ergue os olhos para o amigo que parte para as estrelas em E.T de Spielberg; um piano abandonado à mercê das marés em The piano de Jane Campion; os sussurros por entre paredes...., num filme de Wong Kar-Wai ( o seu último filme esbanja beleza.), etcs, etcs.
E o cinema, ao dar ,de vez em quando, estas fotografias, acaba por contrariar a sua própria essência. E,ainda bem que assim é.
Do filme The Hours, fiquei só com uma fotografia. Não sei muito bem como pode ser expressa em palavras, porque considero a imagem mais forte e a mais bonita do filme. Laura no hotel, pensa na morte, imagina a entrar num rio, quase-morte, depois o voltar...passa a mão pelo ventre. Pra mim, há muita luz. Em especial, nas cenas da Virginia. Na primeira cena, acho que a luz solar é demasiada. No livro fala-se de um céu escurecido. Como tu, também gostei do filme, só que não fiz a viagem, porque se calhar não entrei logo no filme ou filme não me agarrou pra dentro. Acho que foi mais a segunda. São os filmes que nos deixam na estação a olhar de fora para dentro.




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